La partida (2013)

Ficha Técnica:
La partida (2013)
País: Cuba/Espanha
Direção: Antonio Hens
Roteiro: Abel Gonzaléz Melo, Antonio Hens
Duração: 94 minutos.

Sinopse:
Cuba, anos 2000. Pobreza e marginalização são o cotidiano dos jovens Yosvani (Milton García Alvarez) e Reinier (Reinier Díaz Vega). O primeiro é assistente do sogro, o contrabandista Silvano (Luis Aberto García). O segundo, desempregado, vive como garoto de programa para estrangeiros endinheirados, sustentando assim a esposa, a sogra e o filho. Os problemas começam quando a amizade entre os dois rapazes se torna cada vez mais séria, ultrapassando as fronteiras da admiração mútua e se convertendo em afeto e atração sexual. Pode o amor dos dois rapazes se fortalecer na misógina e homofóbica sociedade cubana?

Porque ver esse filme:
A vivência da homossexualidade no longa é bem próxima a realidade brasileira dos últimos quinze anos. Além disso, apresenta uma versão realista sobre a maneira como a homossexualidade ainda é objeto de questionamentos na sociedade cubana. Um bônus é a atuação de dois belíssimos atores cubanos do Teatro El Publico, famoso por desenvolver espetáculos contestatórios da moral cubana desde a sua fundação em 1992.

Temas e questões:
Um dos pontos de maior interesse do filme é a tensão entre homoerotismo e masculinidades que os dois personagens mostram. Além disto, a representação de sexualidades divergentes pela sociedade cubana, marcada pela herança colonial misoginia e homofobia em tensão com existência cada vez mais visível de sexualidades divergentes é extremamente significativa.

Comentário:
Da safra de filmes que discutem a homossexualidade em Cuba, iniciada com Morango e Chocolate (1993) e continuada pelo controvertido Antes do Anoitecer (2000), La partida é um dos mais férteis. Primeiro, pela discussão da sociedade cubana sem se preocupar em demonizar ou exaltar a revolução e seu posterior desenvolvimento. Segundo, por colocar no centro da questão os problemas relativos a tensão entre homoerotismo e masculinidade que as personagens, sobretudo Reinier, mostram. É possível ter relacionamentos com homens na sociedade cubana sem deixar de lado o lugar social de macho, mas apenas se for possível seguir certo número de regas: ter relações afetivas com mulheres; não se deixar ser penetrado; aceitar a relação sexual apenas pelo interesse financeiro; e não se deixar envolver além do aspecto monetário e sexual da relação. Em suma, uma espécie de gay por dinheiro, que os jovens que não chegam a universidade nem a carreiras socialmente valoradas podem seguir para manter um padrão de vida menos desconfortável. No caso de Reinier isso é mais claro porque as relações homoeróticas do jovem sustentam a família. Por outro lado, Yosvani é noivo de Gemma, filha do contrabandista Silvano, com acesso a uma vasa confortável e bens de consumo como tênis e roupas de marca. Mesmo assim, é com ele que o telespectador mais se identifica. É óbvio o desconforto da personagem com os negócios do sogro, e o seu apaixonamento por Reinier é o caminho para a destruição. Lançado para as ruas, sem outra saída que não se prostituir por dinheiro – numa das cenas mais fortes do filme – e roubar, Yosvani é a vítima por não se conformar com o lugar marginal que o amor entre dois homens possui na sociedade em que vive.

Originalmente publicado no Núcleo UniSex, em 5 de maio de 2015

Shortbus (2005)

Um filme desconcertante. Esta talvez seja uma definição possível para Shortbus (2005), película dirigida por John Cameron Mitchell, também diretor de Hedwig and the angry inch (2001). Rodado em cores fortes, o foco do longa são as trajetórias individuais de casais, gays ou não, em busca da satisfação de desejos pessoais reprimidos em contraste com os limites e traumas muitas vezes auto-impostos. Alguns em busca da felicidade, outros da salvação, ou de prazer, ou calor humano visitam a boate/cabaré Shortbus.

Numa New York de papel machê, o que fica em relevo são as fragilidades humanas, medos e neuras que persistem e frequentemente afetam a busca pela felicidade no presente. Este foi o caso da “protagonista” do longa, Sofia (Sook Yin-Lee), terapeuta de casais eternamente em busca do orgasmo; ou de Jamie (PH DeBoy) e James (Paul Dawson), casal gay marcado pela carência de confiança ao lado do excesso de cuidado; ou ainda Severin (Lindsay Beamish), prostituta dominatrix incapaz de se sentir realmente conectada com outras pessoas.

Numa proposta de tentar abordar as diferentes formas de amor, sem problematizar número de integrantes de uma relação, fetiches, diferenças etárias, etc., o filme pode ser entendido como um chamado pela busca do amor como prática, do encontro e afeto pelo outro e por si mesmo apesar de todas as limitações – e não em busca de aspirações ou representação impossíveis, contidas em fórmulas batidas.

Publicado originalmente no Núcleo UniSex, em 16 de Outubro de 2013